Ambição
Dois velhos conhecidos encontram-se e trocam saberes sobre a vida.
- Ontem encontrei o Fábio lá no supermercado e conversamos sobre os problemas que ele vem enfrentando. Eu fiquei boquiaberto...
- Como gerente daquela enorme unidade, ele deve ter muitos problemas.
- Falta de funcionários. Alguns problemas que ele enfrenta: candidatos não vêm para a entrevista; chegam atrasados no primeiro dia; não retornam no segundo dia; largam uma tarefa no meio para irem fumar etc.
- A faixa etária deve ser por volta dos 20 anos, não?
- Exato. No primeiro dia de um cortador de frios, ele sai para fumar deixando a máquina ligada e sem remover o que estava cortado. Ao voltar, é repreendido pelo colega, dá meia volta e some. Um ex-quase-futuro funcionário, imagine!
- Então, ninguém pode ser repreendido. Pode até gerar processo de trabalho.
- Fábio me diz que os comunicados são sempre para toda a equipe. Segundo ele, esses jovens, entre 18 e 25 anos, não toleram serem contrariados.
- É compreensível. Não receberam limites em casa muito menos na escola. Não foram treinados para desenvolver resiliência. Reagem abandonando tudo.
- Ele me conta que uma caixa, no terceiro dia, discutiu com uma cliente. Em vez de acionar a supervisão, levantou-se, pegou suas coisas e foi embora. A cliente ficou um tempão esperando pela volta dela, e nada. Dá para acreditar?
- Fábio comentou se essa crise é só na sua unidade?
- Essa crise é geral. Contou-me que as grandes construtoras canibalizam funcionários umas das outras. Como são terceirizados, largam tudo e migram.
- No nosso tempo, um emprego fixo era a ambição de todo jovem, lembra-se?
- E como! Um emprego numa automobilística como VW, GM, Ford era para a vida toda. Os que mudavam de emprego tinham “carteira suja”, lembra-se?
- Sim. Os tempos são outros e os valores, também. Como fica uma vida em que não se estuda nem se trabalha? O que sobra? Como ficam as despesas? O que se constrói? Não consigo entender esse modo de vida...