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René Henrique Götz Licht
Escritos de uma vida
Textos
Desvalor
Dois velhos conhecidos encontram-se e trocam saberes sobre a vida.

- Eu tenho investido algum tempo para observar como anda o relacionamento entre empresas e seus funcionários, mas isso não me tem feito bem, sabe?

- Eu posso imaginar. Faz anos, e muitos, que a relação é utilitarista e pelas duas partes. Os vínculos afetivos deram lugar a vínculos de rendimento.

- Vi, no site do banco, que tenho uma nova gerente. Nada é explicado. O que houve com a anterior que me atendia muito bem? Foi substituída. Como a gente substitui a borracha que veda a tampa da panela de pressão.

- Exato. O banco não espera que se formem vínculos entre gerentes e clientes.  Você já imaginou o que pode acontecer a um chefe que corrige um funcionário para que ele faça certo a sua tarefa? Pode ser denunciado por assédio moral.

- E nós temos exemplos disso. E como esse impasse é resolvido? O funcionário que não corresponde não é orientado nem ensinado; é demitido. E esse tipo de relação sem afeto, distancia a empresa dos funcionários.

- O que você busca no seu trabalho? Dinheiro. O que a empresa espera do funcionário? Que ele faça seu trabalho ao menor custo. Isso me parece tão evidente nas relações empregador-empregado.

- Houve uma época em que se falava muito em “vestir a camisa”, lembra-se? Ser parte da família das organizações X. Ter orgulho de trabalhar para a companhia Y.

- Dos mais velhos dizia-se que “tinham plaquinha de ativo fixo” porque faziam parte da história da empresa. Era até natural um empregado defender a sua empresa e referir-se a ela com sentimento de orgulho.

- Hoje, as relações estão terceirizadas. A empresa precisa da minha mão de obra e eu preciso do dinheiro do pagamento. Eu me sinto bem, se achar que meu salário é bom. Mas posso mudar de opinião; não tenho vínculos afetivos.

- Sabe que eu vejo vantagens nessa relação de desapego entre empresa e funcionário? Os dois lados entendem que a relação pode ser rompida a qualquer momento, por qualquer uma das partes. Há menos medo para mudar.

- Esse desapego estendeu-se às pessoas. Se uma relação afetiva anda complicada, melhor trocar que tentar consertar. O valor é o do desvalor!
René Henrique Götz Licht
Enviado por René Henrique Götz Licht em 14/08/2024
Alterado em 20/08/2024
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