Dois velhos conhecidos encontram-se e trocam saberes sobre a vida.

- Você já reparou como as mídias sociais mudaram nossos hábitos de leitura?

- O volume de informações é assustador e a maioria absoluta, não me interessa. Eu acabo simplesmente passando por cima de muita coisa.

- Isso! Esse “passar por cima” significa que a gente lê sem foco; faz uma varredura rápida pelo texto.

- Habituamo-nos a escanear textos. Eu me esforço para desfrutar de um bom texto, mas o hábito de fazer essa varredura, como você diz, não é um aliado.

- Eu mandei uma mensagem para o síndico indicando que era apenas para informação. Ele me responde afirmando que não havia entendido a mensagem, mas que já a havia encaminhado ao pessoal da portaria remota.

- Ele não entendeu, mas reencaminhou sua mensagem. Estranho, não?

- Eu recebi uma ligação identificada como sendo de um salão de beleza. Não atendi, por assumir que fosse algum golpe. Era da nossa portaria remota para avisar que o técnico havia chegado.

- Eu também não atenderia. Como uma portaria remota, preocupada com segurança, liga de um número cuja titularidade é de um salão de beleza?

- Exatamente. Questionei a portaria sobre isso, mas todos se esquivaram de me fornecer uma resposta. Informei o síndico, didaticamente, mas ele responde que não entendeu, e, mesmo assim, encaminhou minha mensagem à portaria.

- Esse síndico deve ter escaneado sua mensagem, sem lê-la de fato.

- Quando lhe perguntei o que ele não havia entendido, ele me responde que “leu melhor e entendeu o contexto e que concorda comigo”. Isso acontece quando lemos fazendo varredura; não é leitura atenta, focada.

- Imagine que você se dispõe a ler um conto e o faz dessa maneira, escaneando. Onde fica o sabor das palavras? Onde ficam as nuanças das entrelinhas? Será que um escaneamento captura uma ironia ou um sarcasmo?

- Esse tem sido o meu dilema. Eu tenho que me preocupar com o que é texto de consumo e o que é texto para ser saboreado. Escanear mata todo o sabor!